terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Qual a diferença?


Carlos Eduardo Novaes, O Globo
Houve uma época — durante o regime militar — em que havia somente dois partidos políticos no país (Arena e MDB).
Houve também uma época — mais recente — em que o Brasil tinha apenas duas facções criminosas (CV e PCC).
Com o correr do tempo e o andar da carruagem, os partidos políticos foram se multiplicando feito coelho, e as facções criminosas acompanharam este milagre da multiplicação.
Hoje, o país abriga 35 partidos políticos e 25 facções criminosas.
Nunca ninguém moveu uma palha — muita conversa fiada apenas — para conter o crescimento dos partidos e das facções.
Os partidos são representados no Congresso e nas Assembleias, enquanto as facções são representadas nas cadeias e penitenciárias.
Tanto os partidos quanto as facções são organizações de alcance nacional, com seus símbolos, estatutos e conselhos.
O Partido Popular (ex-PPB), por exemplo, se propõe à construção de uma sociedade justa, livre, democrática, solidária e pluralista. Já o código de conduta da facção Família do Norte (FDN) propõe “luta, união, justiça, respeito e liberdade”.
Como ocorre entre os partidos, nas facções também há grandes e pequenas agremiações.
A facção do PCC, por seu tamanho e capilaridade, é considerada o PMDB da bandidagem (sem colarinho branco). As minúsculas facções Cerol Fino e Consórcio do Crime são comparadas ao Partido Pátria Livre.
Como ocorre entre os partidos, as facções também fazem alianças. Agora mesmo, no massacre de Manaus, descobriu-se que o CV e a FDN se aliaram contra o PCC.
Não há noticias de nenhum membro das diversas facções presente nas Câmaras e Assembleias Legislativas. Mas todos sabemos que vários representantes de partidos políticos estão presentes em cadeias ou na penitenciária em Curitiba.
Tanto os representantes dos partidos quanto os das facções estão atrás das grades porque, é obvio, cometeram algum tipo de delito.
Caso, no entanto, seja feita uma pesquisa, ela vai revelar que boa parte dos detentos jogados como animais nas penitenciárias cometeu crimes menores do que os membros de partidos instalados no Complexo Penal de Pinhais.
O presídio tem capacidade para abrigar 700 presos. Sabe quantos estão engaiolados lá dentro? 700! As penitenciárias que mantêm as facções transbordam, com mais de 200 mil apenados acima de suas capacidades. No espaço reservado para um detento estão espremidos cinco!
Conclui-se então — mais uma vez — que aquele texto constitucional que afirma que “todos são iguais perante a lei” é pura cascata.
Quer uma prova?
José Dirceu foi flagrado com um carregador de celular em sua cela e foi castigado: 20 dias sem receber visitas. Entre a rapaziada de chinelo e camiseta que é apanhada com celulares — algo que quase nunca acontece —, o castigo é outro: uma temporada na “solitária” e cancelamento do tempo que estava contando para redução da pena.
As semelhanças são muitas; mas as diferenças, maiores ainda.
Os bem-nascidos detentos de partidos não precisam ir além do tráfico de influência. A bandidagem das facções mata, esfola, degola, trafica armas e drogas e nem sabe pronunciar “Odebrecht”.

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