O evento de violência organizada batizado de guerra
O mais racional dos animais, o ser humano também pode trazer dentro de si o instinto de um macaco assassino. Por Claudio Carneiro
A guerra se manifesta de diferentes maneiras. Pode ser uma briga entre torcidas, um tiroteio, um ataque terrorista, a invasão do Iraque ou qualquer outro ato que tenha — em comum — a violência maciça e organizada. A mais recente edição da revista História, editada pela Biblioteca Nacional, é dedicada ao número aleatório de “Dez Batalhas” que deixaram cicatrizes na História do Brasil. Para divulgar cada uma das edições – mas também promover uma discussão inteligente – é organizado um debate na última terça-feira de cada mês.Professor da UFRJ e da Escola Superior de Guerra, Francisco Carlos surpreendeu a plateia citando um corolário de sete razões que explicariam porque as guerras proliferaram em toda a história da humanidade. Difícil controlar o impacto de ouvir que “todo ser humano traz dentro de si o instinto de um macaco assassino”, inegável aspecto biológico que contribuiu para a maioria dos episódios sangrentos patrocinados pelo mais racional dos animais.
Outros aspectos que levariam à guerra são, por exemplo, o patológico – a loucura de Hitler, e o biológico, baseado nos princípios da rejeição às diferenças, da territorialidade e do apego à hierarquia, comum a vários animais. Lembra o professor que quando Einstein escreveu a Freud – sete anos antes da Segunda Guerra Mundial – perguntando “por que a guerra?”, o psicanalista respondeu ao físico que a violência é normativa, contempla o instinto de vida e da morte, como o amor e o ódio. Marx, por sua vez, pregava que a violência era fruto de uma sociedade de classes. Mas ainda no século XVIII, teria sido o filósofo prussiano Immanuel Kant quem pregou a interferência entre países em busca da “Paz Perpétua” – que preconiza os princípios da Organização das Nações Unidas (ONU).
Exércitos de um homem só e países sem exércitos
A despeito do que chama de “pretensa ternura brasileira”, Francisco Carlos lembrou que já houve mais de duas mil batalhas em nosso país – muitas delas motivadas pela conquista e demarcação de nosso território. “Talvez estejamos entre os povos mais beligerantes”, ressalta. A Guerra do Paraguai, o mais violento episódio de todos os tempos no continente, pode ter custado a vida de cerca de 400 mil pessoas. Num único dia, na Batalha de Tuiuti, o número de mortos foi cinco vezes superior ao número de vítimas – 3.278 – do ataque às Torres Gêmeas de 11 de setembro de 2001.
Contam-se nos dedos – Islândia, Costa Rica, Vaticano e Haiti são alguns deles – os países que não têm exércitos formais. Enquanto outros – desnecessário citá-los — patrocinaram ou se envolveram em um sem-número de guerras, invasões e massacres. Na maioria destes episódios, houve flagrante abuso de poder econômico. Talvez por esse motivo, este mesmos países tenham verdadeiro pavor aos ataques de exércitos de um homem só – em ações terroristas – que não requerem tanta estratégia, provocam poucas perdas do lado atacante e, além disso, são de baixíssimo custo. Esse recente episódio na Noruega é um lamentável exemplo disso.
Historiador da Fundação Cultural do Exército Brasileiro, Adler Homero, por sua vez, lembrou que muitos episódios de nossa história sofreram fortes toques de maquiagem e romance, como as batalhas pela Independência – que perduraram por quatro anos após o grito do Ipiranga -, e também na Guerra do Paraguai, ou ainda no grupo de bandoleiros e sanguinários liderados por Lampião. E mais: “o povo brasileiro não é cordial. A ascensão social prometida para os escravos que se alistassem foi esquecida ao final da Revolução Farroupilha ou mesmo no retorno de Assunção”, quando os sobreviventes foram parar num hospital na adequadamente batizada de Rua dos Inválidos, no centro do Rio de Janeiro.
A despeito dos fatos pregressos, Adler é otimista em relação ao futuro: “O número de conflitos hoje é muito menor do que no passado. E, no caso brasileiro, a nossa diplomacia tem sido sábia, mesmo que tenhamos “forças” para nos defender, se necessário”, concluiu.
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