sábado, 26 de janeiro de 2013

- Murilo Mendes


Canto a Garcia Lorca 

Não basta o sopro do vento 
Nas oliveiras desertas, 
O lamento de água oculta 
Nos pátios da Andaluzia.
Trago-te o canto poroso, 
O lamento consciente 
Da palavra à outra palavra 
Que fundaste com rigor.
O lamento substantivo 
Sem ponto de exclamação: 
Diverso do rito antigo, 
Une a aridez ao fervor,
Recordando que soubeste 
Defrontar a morte seca 
Vinda no gume certeiro 
Da espada silenciosa 
Fazendo irromper o jacto
De vermelho: cor do mito 
Criado com a força humana 
Em que sonho e realidade 
Ajustam seu contraponto.
Consolo-me da tua morte. 
Que ela nos elucidou 
Tua linguagem corporal 
Onde el duende é alimentado 
Pelo sal da inteligência, 
Onde Espanha é calculada 
Em número, peso e medida.

Murilo Monteiro Mendes (Juiz de Fora, 13 de maio de 1901 - Lisboa, Portugal, 13 de agosto de 1975) - Poeta da chamada 'segunda geração modernista', passou várias mudanças na linguagem aos longo de sua obra, do poema-piada, religioso ao surrealismo. É considerado um dos mais importantes poetas brasileiros. Publicou livros de poemas, de prosa e de frases. Viveu os últimos quinze anos de sua vida em Roma, onde deu aula de Literatura Brasileira.