domingo, 17 de julho de 2011

PERFURO O VENTRE DA ESCURIDÃO/ JORGE MAUTNER

Perfuro o ventre da escuridão
onde as coisas se escondem
porque estão cheias de sim e de não e de confusão
e quando pergunto sobre qualquer assunto nunca
respondem
São como coisas presas ao labirinto
com algemas nos pulsos e tudo
são cinco pras cinco e eu já me sinto
dentro do seu não e de um caixão de veludo

Toca teu samba, toca
e tortura meu ser com prazer de ser
a tortura como aquela coisa que nos choca
onde a alegria me enganava se dizendo a alegria de não ter

Não ter o quê?
Ora, tá na cara
não ter é não ter você
seja com grilo ou seja odara

Luas de prata conseguem
fazer com que lentamente
as sensações das emoções naveguem
e invadam como as fadas minha mente

Doem-me todas as cicatrizes
e sinto as rugas das verrugas
Sei que és como atores e atrizes
e que sempre atacas quem te quer por em fugas

Tocas então mil serenatas
e antigas cantigas e rondós
depois mijas no chão como os cães vira-latas
e ficas falando de ti quando estamos a sós

É por isso que sinto todos estes e aquelas
dores incolores e na garganta estes nós

Nem as cores de óleos, hologramas ou aquarelas
poderiam expressar tão bem estes meus ós, ós, ós!



Henrique George Mautner, ou Jorge Mautner, nasceu no Rio de Janeiro no dia 17 de janeiro de 1941. Conhecido pelo seu trabalho de compositor e cantor brasileiro é umas das grandes referências do Tropicalismo. Publicou treze livros desde 1962, quando estreou na literatura com o livro Deus da Chuva e da Morte, com o qual ganhou o prêmio Jabuti.

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